Nise da Silveira (Maceió, 15 de fevereiro de 1905 — Rio de Janeiro, 30 de outubro de 1999) foi uma renomada médicapsiquiatra brasileira, aluna de Carl Jung.
Dedicou sua vida à psiquiatria e manifestou-se radicalmente contrária às formas agressivas de tratamento de sua época, tais como o confinamento em hospitais psiquiátricos, eletrochoque, insulinoterapia e lobotomia.
Índice
• 1 Formação
• 2 Prisão
• 3 Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro
◦ 3.1 Pioneira da psicologia junguiana no Brasil
◦ 3.2 Reconhecimento internacional
• 4 Obras publicadas
• 5 Referências bibliográficas
• 6 Referências
• 7 Ligações externas
Sua formação básica realiza-se em um colégio de freiras, na época, exclusivo para meninas, o Colégio Santíssimo Sacramento, localizado em Maceió. Seu pai foi jornalista e diretor do "Jornal de Alagoas".1 2
De 1921 a 1926 cursa a Faculdade de Medicina da Bahia, onde formou-se como a única mulher entre os 157 homens desta turma. Está entre as primeiras mulheres no Brasil a se formar em Medicina.1 Casa-se nesta época com o sanitarista Mário Magalhães da Silveira, seu colega de turma na faculdade, com quem vive até seu falecimento em 1986. Em seu trabalho, ele aponta as relações entre pobreza, desigualdade, promoção da saúde e prevenção da doença no Brasil.
Em 1927, após o falecimento de seu pai, ambos mudam-se para o Rio de Janeiro, onde engajou-se nos meio artístico e literário.
Em 1933 estagia na clínica neurológica de Antônio Austregésilo.
Aprovada aos 27 anos num concurso para psiquiatra, em 1933 começou a trabalhar no Serviço de Assistência a Psicopatas e Profilaxia Mental do Hospital da Praia Vermelha.
Prisão
Durante a Intentona Comunista foi denunciada por uma enfermeira pela posse de livros marxistas. A denúncia levou à sua prisão em 1936 no presídio da Frei Caneca por 18 meses.
Neste presídio também se encontrava preso Graciliano Ramos, assim ela tornou-se uma das personagens de seu livro Memórias do Cárcere.
De 1936 a 1944 permanece com seu marido na semi-clandestinidade, afastada do serviço público por razões políticas. Durante seu afastamento faz uma profunda leitura reflexiva das obras de Spinoza, material publicado em seu livro Cartas a Spinoza em 1995.
Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro
Gravura de William Hogarthrepresentando um manicomio.
O trabalho de Nise da Silveira é pioneiro na luta antimanicomial no Brasil. Em 1944 é reintegrada ao serviço público e inicia seu trabalho no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, noEngenho de Dentro, no Rio de Janeiro, onde retoma sua luta contra as técnicas psiquiatricas que considera agressivas aos pacientes.
Por sua discordância com os métodos adotados nas enfermarias, recusando-se a aplicar eletrochoques em pacientes, Nise da Silveira é transferida para o trabalho com terapia ocupacional, atividade então menosprezada pelos médicos. Assim em 1946 funda nesta instituição a "Seção de Terapêutica Ocupacional".
No lugar das tradicionais tarefas de limpeza e manutenção que os pacientes exerciam sob o título de terapia ocupacional, ela cria ateliêsde pintura e modelagem com a intenção de possibilitar aos doentes reatar seus vínculos com a realidade através da expressão simbólica e da criatividade, revolucionando a Psiquiatria então praticada no país.
O Museu de Imagens do Inconsciente
A biografia de Van Gogh é uma referência importante para os estudiosos interessados em compreender as possibilidades terapeuticas do trabalho criativo frente às perturbações emocionais.
Em 1952, ela funda o Museu de Imagens do Inconsciente, no Rio de Janeiro, um centro de estudo e pesquisa destinado à preservação dos trabalhos produzidos nos estúdios de modelagem e pintura que criou na instituição, valorizando-os como documentos que abrem novas possibilidades para uma compreensão mais profunda do universo interior do esquizofrênico.
Entre outros artistas-pacientes que criaram obras incorporadas na coleção desta instituição podemos citar: Adelina Gomes; Carlos Pertuis; Emygdio de Barros, e Octávio Inácio.
Este valioso acervo alimentou a escrita de seu livro "Imagens do Inconsciente", filmes e exposições, participando de exposições significativas, como a "Mostra Brasil 500 Anos".
Entre 1983 e 1985 o cineasta Leon Hirszman realizou o filme "Imagens do Inconsciente", trilogia mostrando obras realizadas pelos internos a partir de um roteiro criado por Nise da Silveira.
A Casa das Palmeiras
Poucos anos depois da fundação do museu, em 1956, Nise desenvolve outro projeto também revolucionário para sua época: cria a Casa das Palmeiras, uma clínica voltada à reabilitação de antigos pacientes de instituições psiquiátricas.
Neste local podem diariamente expressar sua criatividade, sendo tratados como pacientes externos numa etapa intermediária entre a rotinahospitalar e sua reintegração à vida em sociedade.
O auxílio dos animais aos pacientes
Ao perceber que a responsabilidade de cuidar de um animal e o desenvolvimento de laços afetivos pode contribuir para a reabilitação de doentes mentais, Nise da Silveira os incorporou a seu trabalho como co-terapeutas.
Foi uma pioneira na pesquisa das relações emocionais entre pacientes e animais, que costumava chamar de co-terapeutas.
Percebeu esta possibilidade de tratamento ao observar como um paciente a quem delegara os cuidados de uma cadela abandonada no hospital melhorou tendo a responsabilidade de tratar deste animal como um ponto de referência afetiva estável em sua vida.
Ela expõe parte deste processo em seu livro "Gatos, A Emoção de Lidar", publicado em 1998.
Pioneira da psicologia junguiana no Brasil
Através do conjunto de seu trabalho, Nise da Silveira introduziu e divulgou no Brasil a psicologia junguiana.
Interessada em seu estudo sobre os mandalas, tema recorrente nas pinturas de seus pacientes, ela escreveu em 1954 a Carl Gustav Jung, iniciando uma proveitosa troca de correspondência.
Jung a estimulou a apresentar uma mostra das obras de seus pacientes que recebeu o nome "A Arte e a Esquizofrenia", ocupando cinco salas no "II Congresso Internacional de Psiquiatria", realizado em 1957, em Zurique. Ao visitar com ela a exposição, a orientou a estudarmitologia como uma chave para a compreensão dos trabalhos criados pelos internos.
Nise da Silveira estudou no "Instituto Carl Gustav Jung" em dois períodos: de 1957 a 1958; e de 1961 a 1962. Lá recebeu supervisão em psicanálise da assistente de Jung,Marie-Louise von Franz.
Retornando ao Brasil após seu primeiro período de estudos jungianos, formou em sua residência o "Grupo de Estudos Carl Jung", que presidiu até 1968.
Escreveu, dentre outros, o livro "Jung: vida e obra", publicado em primeira edição em 1968.
Reconhecimento internacional
Foi membro fundadora da Sociedade Internacional de Expressão Psicopatológica ("Societé Internationale de Psychopathologie de l'Expression"), sediada em Paris.
Sua pesquisa em terapia ocupacional e o entendimento do processo psiquiátrico através das imagens do inconsciente deram origem a diversas exibições, filmes, documentários, audiovisuais, cursos, simpósios, publicações e conferências.
Em reconhecimento a seu trabalho, Nise foi agraciada com diversas condecorações, títulos e prêmios em diferentes áreas do conhecimento, entre outras:
• "Ordem do Rio Branco" no Grau de Oficial, pelo Ministério das Relações Exteriores (1987)
• "Prêmio Personalidade do Ano de 1992", da Associação Brasileira de Críticos de Arte
• "Medalha Chico Mendes", do grupo Tortura Nunca Mais (1993)
• "Ordem Nacional do Mérito Educativo", pelo Ministério da Educação e do Desporto (1993)
Seu trabalho e idéias inspiraram a criação de museus, centros culturais e instituições terapêuticas similares às que criou em diversos estados do Brasil e no exterior, por exemplo:
• o "Museu Bispo do Rosário", da Colônia Juliano Moreira (Rio de Janeiro)
• o "Centro de Estudos Nise da Silveira" (Juiz de Fora, Minas Gerais)
• o "Espaço Nise da Silveira" do Núcleo de Atenção Psico-Social (Recife)
• o "Núcleo de Atividades Expressivas Nise da Silveira", do Hospital Psiquiátrico São Pedro (Porto Alegre, Rio Grande do Sul)
• a "Associação de Convivência Estudo e Pesquisa Nise da Silveira" (Salvador, Bahia)
• o "Centro de Estudos Imagens do Inconsciente", da Universidade do Porto (Portugal)
• a "Association Nise da Silveira - Images de L'Inconscient" (Paris, França)
• o "Museo Attivo delle Forme Inconsapevoli" (hoje renomeado "Museattivo Claudio Costa", Genova, Itália)
O antigo "Centro Psiquiátrico Nacional" do Rio de Janeiro recebeu um sua homenagem o nome de "Instituto Municipal Nise da Silveira".
Obras publicadas
• SILVEIRA, Nise da. Jung: vida e obra, Rio de Janeiro: José Álvaro Ed. 1968.
• SILVEIRA, Nise da. Imagens do inconsciente. Rio de Janeiro: Alhambra, 1981.
• SILVEIRA, Nise da. Casa das Palmeiras. A emoção de lidar. Uma experiência em psiquiatria. Rio de Janeiro: Alhambra. 1986.
• SILVEIRA, Nise da. O mundo das imagens. São Paulo: Ática, 1992.
• SILVEIRA, Nise da. Nise da Silveira. Brasil, COGEAE/PUC-SP 1992.
• SILVEIRA, Nise da. Cartas a Spinoza. Rio de Janeiro: Francisco Alves. 1995.
• SILVEIRA, Nise da. Gatos, A Emoção de Lidar. Rio de Janeiro: Léo Christiano Editorial, 1998.
Referências bibliográficas[editar | editar código-fonte]
• CÂMARA, Fernando Portela "Vida e obra de Nise da Silveira" Psychiatry On-line Brazil, 7 de Setembro de 2002.
• CÂMARA, Fernando Portela "A contribuição de Nise da Silveira para a psicologia junguiana" - Psychiatry On-line Brazil, 9 de Março de 2004.
• Gullar, Ferreira. "Nise da Silveira: uma psiquiatra rebelde", 1996.
• FRAYZE-PEREIRA, João A. "Nise da Silveira: imagens do inconsciente entre psicologia, arte e política" in Estudos Avançados. vol.17 no.49 São Paulo Sept./Dec. 2003. Disponível em [1] no formato .pdf
• "Expérience d'art spontané chez des schizophrènes dans un service de therapeutique occupationelle" (em colaboração com o Dr. Pierre Le Gallais, apresentado no II Congresso Internacional de Psiquiatria em Zurique), Congress Report vol. IV, 380-386, 1957.
• Philatelic Release (2005), n. 1, Brasil.
Referências
1. ↑ Os 10 anos da morte de Nise da Silveira (html) (em português). Visitado em 15/01/2010.
2. ↑ Colégio de freiras, francês e disciplina. No ponto de exame, ela recitou Le Cid, de Corneille (pdf) (em português). Visitado em 15/01/2010.
Ligações externas
O Wikiquote possui citações de ou sobre: Nise da Silveira
• Site do Museu de Imagens do Inconsciente
• Textos de Nise da Silveira
• "Nise da Silveira: imagens do inconsciente entre psicologia, arte e política" - João A. Frayze-Pereira
• Mostra Nise da Silveira - Vida e Obra, com diversas fotos
• "A psiquiatria rebelde de Nise da Silveira", por Katia Rubio
• "Mar do Inconsciente - A Imagem Como Linguagem" , com depoimentos de Carlos Drummond de Andrade, Frei Betto e da própria doutora Nise.
• "Felinos e as janelas da mente", matéria da revista Época
• Enciclopédia do Nordeste
ACERVO DE NISE DA SILVEIRA É
EXPOSTO AO PÚBLICO EM SÃO PAULO
Ocupação no Itaú Cultural mostra trajetória da
mãe da psiquiatria humanizada
A psiquiatra Nise da Silveira (1905 – 1999) tinha clientes, não pacientes. Pioneira na humanização da psiquiatria, ela fundou o Museu de Imagens do Inconsciente, em 1952, no Rio de Janeiro.
Em 1936, durante o governo Vargas, Silveira ficou presa por um ano e meio e, como consequência, afastada da carreira até 1944, quando começou a trabalhar em um hospital psiquiátrico, localizado no bairro carioca do Engenho de Dentro.
Ao retornar, ela se deparou com métodos agressivos, como o choque, aplicados em pacientes que sofriam algum tipo de doença mental.
“Nise sentiu na pele o que era viver na cadeia e quando retornou ao hospital psiquiátrico se deparou com hospitais-prisões. As pessoas viviam por trás de grades e tinham hora para tomar sol”, diz Luís Carlos Mello, atual curador do Museu do Inconsciente.
Nos anos 1940, ela encontrou na arte um meio para aqueles internados em manicômios se expressarem.
Tombado pela Unesco na última semana como memória do mundo, as obras e outros artigos – como as anotações, entrevistas e fotos – serão disponibilizados ao público na exposição no Itaú Cultural a partir do sábado (25).
Ao adotar o novo método, ela começou a se corresponder com o suíço Carl Gustav Jung (1875–1961), psiquiatra e fundador da psicologia analítica, que desenvolveu conceitos como personalidade extro e introvertida, arquétipos e o inconsciente coletivo.
No processo de curadoria, documentos foram descobertos, como um vídeo que mostra o encontro da psiquiatra com Jung no Segundo Congresso Internacional de Psiquiatria (1957), em Zurique.
“Jung ficou fascinado com o trabalho da Nise porque ele estudava a ‘cuca’ de pessoas com níveis elevadíssimos de aprendizado enquanto ela estudava pessoas de pouca escolaridade”, conta Mello.
A mostra conta com obras tanto dos clientes que Nise tratou, quanto dos clientes que frequentam hoje o museu.
Entre as pinturas há muitas mandalas. Segundo Gladys Schincariol, colega de profissão de Silveira que também trabalhava no museu, a mandala é resposta positiva do inconsciente quando o sujeito está mais estruturado.
“Hoje, a mandala se tornou esse samba do crioulo doido que qualquer um desenha”. Schincariol explica que para que o tratamento surta efeito, é necessário que o profissional analise os desenhos de seus “clientes”.
Mulher e inovadora, não foi fácil para Silveira que psiquiatras da época aceitassem o método que ela tanto estudava. “O novo é sempre rejeitado. Ela foi uma guerreira que lutou contra uma estrutura usada no mundo”, diz Mello.
Gleise diz que na sala da universidade só Silveira era mulher. “Não tinha nem banheiro feminino, mas ela não levantava bandeira porque a causa pela qual brigava era maior”.